Quem ama não anula ou descaracteriza o seu amado sob o pretexto de estar fazendo o melhor para ele. A imposição do bem traz um mal, porque aniquila um bem fundamental: a liberdade. Isso não quer dizer que abandonemos os filhos à própria sorte, o que seria crueldade, pois eles carecem de um referencial claro, definido e estimulador para a vida. Quem melhor do que os pais para servir de orientadores do descobrimento da vida?
A grande questão é que não basta que reproduzamos os princípios e os critérios sem os apresentarmos de uma forma viva e dinâmica, isto é sem que sejam percebidos através do nosso exemplo. Mas, apenas o exemplo não é o suficiente; é preciso que os filhos sintam o amor que temos por eles quando lhes sugerimos uma trajetória de vida. Perceber e sentir são ações indispensáveis para que possam apreender os valores a eles expostos e que servirão como sugestão para que elaborem sua forma pessoal de viver. Sem amor, dificilmente conseguiremos disposição nos filhos para considerar com seriedade as metas que lhes oferecemos.
É na relação entre mãe e filho que vemos a dimensão da ligação afetiva que se estabelecerá durante a vida toda. De início, há uma troca desigual, porque a mãe é a que dá quase tudo, enquanto o filho é o que recebe sem dar quase nada. Nessa forma aparentemente descompensada de relação afetiva está, no entanto, a preparação para a visão abrangente do sentido do amor para a vida humana. Dessa convivência afetiva muito dependerá a maneira pela qual o filho, como adulto, compartilhará seus afetos com as outras pessoas. Se à criança, durante a primeira infância, for negado o que o amor da mãe pode lhe oferecer, ficará desguarnecida de um recurso fundamental para sua realização como pessoa. Poderemos incluir nessa fase, também, a figura do pai, que vem completar o espectro de referenciais para que o filho seja iniciado no processo de amar a si e as outras pessoas para que sua vida seja plena de sentido. Pais que se eximem de manifestar amor aos filhos, seja sob que pretexto for, estão lançando no caminho deles obstáculos que, para alguns, poderão ser instransponíveis.
É comum encontrarmos pais que, diante da distorção do comportamento dos filhos, adolescentes ou adultos, perguntam: “Onde foi que eu errei?” referindo-se a ações e metodologias que, porventura, tivessem sido inadequadas. Não se lembram que, antes de todas as formas de ensinamento, vem a manifestação de afeto. Daí para adiante, os métodos, as técnicas e tudo o mais que possamos aprender para ajudar os filhos será útil para promover o crescimento pessoal.
Não negamos que o filho precisa dos pais; o que esquecemos, quase sempre, é que, antes de tudo, os pais é que precisam do filho. Precisam dele para amá-lo. Nunca seremos completos sem amar alguém. O amor é um atributo humano que não pode ser contido nos limites da individualidade, sob pena de se transformar em amargura e sentimento de impotência. Quanto mais amamos, mais nos sentimos humanos. É porque precisamos do filho para amá-lo, que ele descobre que precisa de nós para nos amar.
Quando falamos de amor aos filhos, sobretudo, na primeira infância, não damos ênfase ao aspecto subjetivo do amor, pelo contrário, nos referimos às formas concretas e objetivas, que estão ao alcance da compreensão deles. Isso quer dizer que é sumamente importante que o amor seja traduzido em carinho, aconchego, presença e proteção física.
O aconchego corporal é insubstituível. O que transmite o que nenhuma palavra pode comunicar. Acarinhar, beijar, aconchegar ao colo infundem segurança e produzem tranqüilidade. Não se trata, entretanto, de uma aproximação corporal formal. Abraçar, por exemplo, não é segurar. É muito mais; é uma ação de afirmação da disponibilidade de estar junto para enfrentar qualquer situação: é uma forma de expressar semelhança e, portanto, capacidade de compreender. Quando duas pessoas se abraçam é como se uma se visse refletida na outra, da mesma maneira como se cada uma se visse refletida num espelho. Abraçar é dividir o calor que se tem.
Se não nos tocamos corporalmente seremos como estranhos, porque nos faltará o sentido concreto da textura física peculiar do outro. Para a criança, essa é uma forma básica de conhecimento. Não é sem propósito que um dos meios mais primitivos de que o recém-nascido dispõe para conhecer e, posteriormente, reconhecer sua mãe, é sentir a textura de sua pele.
Vale ressaltar que o contato corporal em forma de carícia tem sua importância, porém, precisa ser acompanhado da palavra. É indispensável falar ao filho, pois a palavra dá dimensão à carícia. Assim, pais que acariciam e falam com seus filhos vão, ao longo do tempo, aperfeiçoando sua forma pessoal de exprimir o amor que têm por eles.
Os adultos têm, hoje, uma tarefa gigantesca, que é desempenhar suas obrigações pedagógicas com a geração pela qual são responsáveis. A família é o território no qual existe a melhor possibilidade de preparação para a vida, porque dá a cada um oportunidade de vivenciar experiências boas e desagradáveis e encontrar a forma individual de resolvê-las. Se os mais experientes e amadurecidos do grupo familiar expressarem seu amor, sem dúvida, todos serão beneficiados. Se não vivermos uma relação de amor com nossos filhos estaremos sendo injustos com eles; eles vieram como resultado de um desejo ou por nossa aprovação. Amar e expressar amor aos filhos é um ato de justiça.